Bancos brasileiros lideram movimento para recuperar credibilidade do mercado de carbono
Instituições financeiras do Brasil estão se mobilizando para restaurar o que o mercado de carbono mais perdeu nos últimos dois anos: credibilidade.
O lançamento da Ecora – uma certificadora de créditos de carbono estabelecida pelo Bradesco, BNDES e o Fundo Ecogreen – durante a COP30 representa a iniciativa mais ousada até o momento. Paralelamente, o Itaú e a B3 atuam em frentes complementares para recuperar a integridade do mercado e prepará-lo para expansão.
‘O Brasil possui condições exclusivas para liderar essa nova economia verde, mas isso demanda confiança,’ afirmou o CEO do Bradesco, Marcelo Noronha, ao Brazil Journal. ‘Identificamos falhas de projeto globalmente, projeções excessivamente otimistas e pouca análise crítica. Absorvemos esse aprendizado e queremos oferecer uma certificadora com tecnologia e visão local, adaptada aos biomas e ao contexto fundiário nacional.’
O diagnóstico do problema já está claro.
‘Existem projetos que levam de 24 a 36 meses para serem certificados, com baixa replicabilidade e uso limitado de tecnologia,’ explicou Vicente Mello, vice-presidente da Aecom, empresa especializada em projetos de infraestrutura responsável pelo estudo técnico que fundamentou a Ecora. ‘Globalmente há aproximadamente 14.500 projetos registrados; no Brasil, menos de 500. Não temos limitações de potencial nem de demanda, temos gargalos processuais.’
A Ecora busca enfrentar essa fragmentação através de uma plataforma que integra dados públicos, análises geoespaciais e o ciclo completo dos créditos — desde a concepção até a aposentadoria — reduzindo prazos, custos e assimetrias informacionais.
Porém, o movimento de reconstrução da credibilidade não se restringe à certificação.
O Itaú Unibanco pretende transformar integridade em lastro financeiro. ‘O mercado de carbono é extremamente relevante, mas necessita de infraestrutura que garanta a integridade do crédito,’ declarou Fabio Guido, superintendente de sustentabilidade do banco.
Para ele, o carbono representa mais que um ativo ambiental, é um instrumento financeiro potencial – desde que possua lastro robusto.
‘O valor não é apenas monetário. Com integridade, o crédito de carbono pode atrair capital do Hemisfério Norte, financiar transição tecnológica e preservar florestas,’ complementou Guido.
Guido visualiza oportunidades para estruturas financeiras lastreadas em carbono — garantias, reembolsos e financiamento misto — e para a expansão do REDD+ jurisdicional, mecanismo de contabilidade e negociação de carbono estabelecido pelo Acordo de Paris. ‘O desafio consiste em integrar o mercado brasileiro aos mercados globais. A regulação já indica o caminho.’
A B3 também atua para reconstruir a base técnica que determina preços e confiabilidade ao mercado. ‘O mercado de carbono possui correlação direta com o mercado tradicional de negociação de ativos, e é nesse ponto que a B3 atua,’ afirmou a vice-presidente de sustentabilidade da Bolsa, Ana Buchaim.
Segundo ela, a questão da credibilidade percorre toda a cadeia. ‘O produtor precisa compreender a metodologia e ser remunerado pelo serviço ambiental; o desenvolvedor deve reduzir riscos; a certificadora precisa ser sólida; e o registro deve ser íntegro para que o comprador tenha segurança.’
O papel da B3 é aplicar sua especialidade: infraestrutura tecnológica. ‘Ao registrar um crédito e compreender quem negociou com quem e por qual valor, contribuímos para a formação de preços com transparência. Quanto mais informação, mais fácil encontrar o preço justo,’ explicou.
Além disso, Buchaim observa relação direta entre a recuperação da confiança e o crescimento dos títulos temáticos, os green bonds. ‘De 2024 para 2025, houve crescimento de 26% no depósito desses títulos na B3. Temos um estoque de quase R$ 140 bilhões, com mais de 300 ativos verdes. Quanto maior a transparência, mais esses instrumentos ganham força.’
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