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Correios negociam empréstimo bilionário com taxas acima do teto estabelecido pelo Tesouro

O Conselho de Administração dos Correios autorizou nesta quinta-feira (28) a continuidade das tratativas para contratação de um financiamento de R$ 20 bilhões junto a instituições financeiras, considerando as condições apresentadas nesta segunda rodada de propostas. O custo financeiro ficou acima do limite máximo de 120% do CDI estabelecido pelo Tesouro Nacional, aproximando-se de 136% do CDI, mas ainda pode sofrer alterações durante as negociações.

Conforme informações obtidas pelo Valor, a operação ainda precisa ser avaliada pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Somente após essas etapas será possível prosseguir com a efetiva contratação do empréstimo. Os Correios buscam uma garantia da União para viabilizar a operação financeira.

Simultaneamente, o governo federal analisa publicar um decreto e uma portaria para autorizar que a União ofereça aval ao empréstimo. A proposta é criar um tratamento jurídico específico para empresas estatais não dependentes que apresentam risco de se tornarem dependentes, o que inclusive permitiria a garantia governamental mesmo em operações com taxas superiores ao teto de 120% do CDI fixado pelo Tesouro. A medida proporcionaria segurança jurídica para concretizar a operação, considerada de alto risco.

Segundo apurações do Valor, a Comissão Interministerial de Governança Corporativa e de Administração de Participações Societárias da União (CGPAR) resolveu estudar uma modificação no Decreto 12.500/2025 – que regulamenta a transição entre estatais dependentes e não dependentes. A alteração buscaria prever a situação de empresas que, mesmo classificadas como não dependentes, necessitem de recursos para custeio e sobre a concessão de garantia a essas organizações.

O decreto atual estabelece que uma estatal não dependente que receba aportes para ampliação da participação acionária do controlador deve informar ao Ministério da Gestão a aplicação dos recursos no exercício anterior. Caso utilize esses valores para despesas de custeio e pessoal, a empresa pode apresentar um plano de reequilíbrio econômico-financeiro, com duração máxima de dois anos, contendo ajustes de despesa e de receita capazes de garantir sua permanência como não dependente.

A situação dos Correios, entretanto, não se encaixa nesse modelo, uma vez que a empresa não recebeu aporte para gastos de custeio e, portanto, não está obrigada a apresentar um plano de reequilíbrio nos termos do decreto. Ainda assim, a área econômica avalia permitir que o plano de reestruturação já elaborado pela estatal – com medidas de ajuste de despesas, incremento de receitas e novas estratégias de negócios – seja reconhecido como instrumento suficiente para fundamentar a concessão da garantia da União, mesmo que parte das medidas ainda não tenha sido implementada.

Como a operação é considerada de risco, diante da fragilidade financeira da empresa, a mudança normativa funcionaria como uma proteção jurídica para o Tesouro e para os demais órgãos envolvidos, assegurando respaldo formal para a concessão da garantia.

Conforme revelado anteriormente, a primeira tentativa de obter crédito previa uma operação considerada de valor elevado, de R$ 20 bilhões, e com prazo reduzido para resposta, o que limitou a concorrência e levou um sindicato de quatro bancos a oferecerem taxas muito altas, de 136% do CDI. Mesmo após algumas instituições reduzirem o custo, a diminuição ficou distante do que a direção da estatal considerava razoável.

Com isso, os Correios decidiram abrir essa nova rodada de captação, mais flexível. A oferta continuava prevendo até R$ 20 bilhões, mas a empresa trabalhava com a expectativa de levantar pelo menos R$ 10 bilhões, desde que o custo permanecesse dentro do limite estabelecido. Contudo, as propostas chegaram novamente acima do limite de taxa de 120% do CDI fixado pelo Tesouro, teto validado esta semana pelo Comitê de Garantias do órgão.

O Valor apurou que a empresa encaminhou nesta quinta-feira ao Tesouro Nacional e ao Tribunal de Contas da União (TCU), sob regime de confidencialidade, o plano de reestruturação, sem o pedido de garantia da União. O plano prevê uma primeira etapa de R$ 10 bilhões ainda neste ano e outras duas de R$ 5 bilhões em 2026. O documento considera um custo de 120% do CDI. Se os juros forem superiores, a estatal terá que ampliar a geração de receita prevista no plano, algo que já está contemplado nas estimativas internas, segundo fontes.

O documento inclui ainda uma operação de R$ 4,4 bilhões junto ao Novo Banco de Desenvolvimento (NDB), do BRICS, destinada a investimentos em modernização e maquinário. Em linhas gerais, o plano detalha a operação de crédito, apresenta o fluxo de pagamento e demonstra que a receita projetada será suficiente para honrar a dívida contratada, de R$ 24,4 bilhões totais, conforme o planejamento. O documento estabelece que o empréstimo de R$ 20 bilhões terá carência de três anos e vencimento em 2040, motivo pelo qual o plano também se estende até esse horizonte.

Apesar de o plano ter sido enviado aos órgãos, os Correios ainda não encaminharam o pedido de garantia nem os detalhes da operação. A estatal vê o documento como peça central para buscar a aprovação do Tesouro, embora não exista obrigação legal de apresentá-lo neste momento. A empresa busca R$ 10 bilhões para equilibrar as contas deste ano e antecipar algumas despesas, mas há a percepção de que o prazo até o final do ano possa ser insuficiente para obter todo o montante. A necessidade mais urgente da estatal gira em torno de R$ 6 bilhões.

Os Correios informaram nesta sexta-feira (28) que o prejuízo acumulado no ano alcançou R$ 6 bilhões até setembro, em período marcado por redução nas receitas e aumento nas despesas operacionais. A receita líquida com vendas e serviços é de R$ 12,3 bilhões até setembro. De acordo com o balanço, somente o custo total da empresa no período corresponde a 95% da receita líquida e as despesas financeiras, 9%.

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