Estudo revela que Santos exporta mais microplásticos para o oceano do que retém em suas praias
Pesquisa do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo indica que 68% das partículas permanecem suspensas no estuário e 23% seguem para mar aberto
A maior parte dos microplásticos liberados no estuário de Santos tem como destino o mar aberto, em vez de ficar retida nas praias ou na costa da cidade, de acordo com estudo do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP). Uma vez no oceano, essas partículas rapidamente alcançam a corrente marítima brasileira e se deslocam ao longo do litoral, de sul para norte, ampliando os impactos ambientais.
O trabalho, divulgado na revista científica Ocean and Coastal Research, demonstrou que apenas 9% dos microplásticos ficam acumulados no fundo e nas margens do estuário. O restante permanece suspenso na coluna d’água dentro do estuário (68%) ou vai para o mar aberto (23%).
Arian Dialectaquiz, oceanógrafo e um dos autores da pesquisa, esclarece que partículas ‘ativas’ na coluna d’água – como ocorre com a maior parte em Santos – são mais facilmente consumidas por organismos marinhos. ‘Elas estão em movimento constante e degradação, tendo maior probabilidade de entrar na cadeia alimentar’, explica. Quando se acumulam na costa, tornam-se menos disponíveis para o ecossistema.
Os microplásticos são partículas plásticas muito pequenas, com diâmetro menor que cinco milímetros. No estuário de Santos, área de transição entre rio e oceano, essas partículas são liberadas principalmente pelos resíduos urbanos transportados pelos canais, e por atividades portuárias, de pesca e navegação, onde há degradação de redes, cordas e boias.
Dialectaquiz destaca que a própria configuração geográfica de Santos, localizada entre Guarujá, ao norte, e São Vicente, ao sul, favorece o aprisionamento de poluentes na baía.
O estudo revela, contudo, que o percurso dos microplásticos varia conforme o comportamento da maré. Eventos de elevação extrema do nível do mar, como ressacas, empurram as partículas para a costa, acumulando-as nas praias e margens de canais. As praias centrais de Santos, os canais urbanos e a região da Ilha Porchat, voltada para São Vicente, foram identificadas como as áreas mais suscetíveis à retenção das partículas.
Já em períodos de mar mais tranquilo ou de nível mais baixo, as partículas tendem a permanecer dispersas na coluna d’água e, assim, alcançarem o mar aberto. ‘Essa permanência prolongada também faz com que as partículas sejam absorvidas por organismos filtradores, como esponjas do mar, moluscos e pequenos peixes, e impactem toda a cadeia alimentar’, afirma Dialectaquiz. O pesquisador ressalta ainda que, depois de serem ingeridos, os resíduos dificilmente são degradados, já que ficam protegidos da luz e do sal no mar.
O Arquipélago de Alcatrazes, refúgio de vida silvestre a 50 quilômetros da costa de Santos, pode ser um dos destinos dos microplásticos que vão para mar aberto. ‘Pesquisas futuras devem investigar a trajetória dos microplásticos no oceano, mas é provável que eles rapidamente cheguem a ilhas vizinhas’, declara o oceanógrafo.
Para identificar o comportamento dessas partículas, o estudo do IO-USP combinou três sistemas computacionais: um modelo hidrodinâmico, responsável por simular as correntes; um modelo de ondas de superfície e um modelo de deriva de partículas, que reproduz o deslocamento de milhares de fragmentos virtuais de microplásticos.
Os resultados dialogam com pesquisas anteriores. Em 2023, um estudo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), publicado na revista Science of the Total Environment, revelou que o estuário de Santos está entre os mais contaminados por microplásticos no mundo, especialmente na região da balsa Santos-Guarujá. Ostras e mexilhões analisados naquele trecho apresentaram, em média, de 12 a 16 partículas plásticas por grama de tecido, além do pior estado nutricional e de saúde entre os organismos avaliados.
Maior porto da América Latina, Santos recebe resíduos industriais e domésticos de diversos municípios vizinhos. Para Dialectaquiz, é urgente melhorar a gestão do descarte dos resíduos. ‘Agora que já estão lá, o que podemos fazer é avaliar quais são as regiões mais afetadas, e que contextos favorecem a poluição, para pensar em soluções focadas’, aponta.
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